Identidade

Identidade: O cérebro e a mente constituem a origem da identidade pessoal. O avanço das neurociências tem possibilitado a compreensão do cérebro através da neurotecnologia. Genética e neurociências estudam os fundamentos biológicos da identidade social e ambas têm apresentado resultados: existem novas descobertas sobre a relação mente-cérebro; sabemos hoje que certos fármacos podem alterar funções cognitivas como a memória e que algumas psicopatologias, como a esquizofrenia, estão relacionadas com o modo de funcionamento dos neurónios. Estes estudos acerca da mente humana terão repercussões sobre aquilo que entendemos como “identidade”. A identidade é a caraterística de um indivíduo acerca de quem se diz que é sempre o mesmo nos diferentes momentos da sua existência. Pensa em ti próprio quando eras bebé; cresceste e tornaste-te criança; hoje és um adolescente e em breve poderás estar na universidade. O que há em ti que permanece ao longo de todo este tempo? Como é que os outros te identificam como sendo a mesma pessoa? A identidade pode ser definida como a mesmidade – o mesmo, ao longo do tempo. A identidade pessoal é tradicionalmente definida como a essência do Eu. Não é uma entidade estática e imutável, como se se tratasse de uma coisa, um objeto ou uma substância, mas sim um conjunto de capacidades multidimensionais que englobam a representação do corpo, a vida mental do cérebro, todas as experiências de vida e os nossos papéis e estatutos sociais. Além da identidade pessoal, existem vários outros tipos de identidade. Identificamo-nos com um país, uma cultura, uma família; identificamo-nos com as pessoas que têm a mesma idade, a mesma profissão; mais que a determinação biológica sexual, identificamo-nos com um género (masculino ou feminino) e as suas determinações sociais. Atualmente, a identidade pessoal prolongou-se também para o mundo digital: já se pode falar numa identidade digital que resulta da nossa atividade no ciberespaço, quando consumimos e produzimos conteúdos na internet. Quando colocamos um post no facebook, escrevemos um comentário num portal de notícias ou publicamos uma foto numa rede social, estamos a deixar traços indicadores da nossa identidade. A identidade digital é um prolongamento da identidade analógica, sendo essencial ter em atenção a visibilidade que se alcança, a reputação que se conquista e a privacidade que é necessário preservar. A identidade pessoal é uma das propriedades do Eu pessoal, que consiste em o sujeito se reconhecer sempre o mesmo apesar da sucessão constante dos seus múltiplos estados de consciência. O sentimento de identidade pessoal é assegurado pela memória. Sem memória do que somos, de quem somos, do que já fomos, não existiria sentimento de Si, não poderíamos ter a noção de possuirmos uma mesma identidade. As experiências pessoais de cada indivíduo constituem a sua história de vida e são inscritas na sua identidade. Cada um de nós olha para o passado e reconhece-se nas diferentes experiências subjetivas que viveu, mesmo que já não as interprete da mesma forma. Essas experiências subjetivas são inscritas na história de vida do indivíduo. A história pessoal é única e irrepetível, fazendo de cada um de nós uma singularidade que nos torna indivíduos. Mais que a pertença a uma espécie ou a uma cultura, são as histórias de vida que nos tornam únicos e singulares, assegurando a nossa identidade. Existe uma relação de reciprocidade entre o indivíduo e a sociedade. Não existe sociedade sem indivíduo da mesma forma que não se pode conceber um indivíduo enquanto tal isolado de um contexto social. G. H. Mead considera que o Eu de cada um de nós se define pelo exercício da alteridade, isto é, pela interação com o Outro, pelo reconhecimento do Outro. Imagina um espelho: a tua própria imagem refletida no espelho só existe porque tu estás lá, em frente ao espelho. Passa-se o mesmo na sociedade: aquilo que és depende em grande parte da forma como os outros te veem, te reconhecem socialmente.

A noção de identidade está, então, fortemente relacionada com a ideia de socialização, entendida como processo permanente que acompanha o percurso de vida do indivíduo. Ao longo da sua vida, o indivíduo acumula experiências de vida, constrói com elas a sua história de vida e adapta-se sucessivamente a novos contextos, novos papéis sociais, novos estatutos sociais. Os percursos de socialização são procedimentos de ajustamento da identidade, pois ao longo da vida o indivíduo adapta-se a grupos sociais diversificados, assumindo novas identidades grupais. A identidade social exprime-se através da participação em grupos ou instituições sociais. Na relação com o Outro temos a tendência para nos identificarmos mais com algumas pessoas. Por isso, definimos para nós próprios grupos de pertença e grupos de referência, assumimos papéis e estatutos sociais, escolhemos estilos de vida convencionais ou alternativos. Esta definição de Si, da sua identidade, faz-se por comparação / confrontação com aquilo que o Outro é, e ao mesmo tempo depende da avaliação que o Outro faz de mim. Assim, a identidade pressupõe a alteridade. A identidade pessoal é uma construção dinâmica da unidade de consciência de si, através das relações intersubjetivas, das comunicações de linguagem e das experiências sensoriais de cada sujeito. É um processo ativo, afetivo e cognitivo que cada indivíduo elabora, representando-se a si próprio no meio em que está inserido e ao qual associa um sentimento subjetivo de permanência ao longo do tempo. Erik Erikson afirma que o desenvolvimento humano se realiza ao longo de toda a vida, desde o nascimento até à morte. Em cada um dos estádios de desenvolvimento o ser humano confronta-se consigo próprio e com as exigências colocadas pelo meio social. Até que ponto somos aquilo que queremos ser? E seremos aquilo que a sociedade exige de nós? Esta tensão é particularmente evidente na adolescência. Erikson considera que na adolescência se verifica uma crise de identidade: a transição da infância para a idade adulta implica o desenvolvimento de um sentido de identidade. A adolescência é uma época de experimentação de papéis, de escolha de grupos, de estilos de vida, de convicções, de atitudes. As relações humanas são vividas sem compromisso, temporariamente, numa perspetiva de experimentação que culminará na construção da identidade do adulto. Estas conceções de Erikson abalaram as ideias tradicionais, que situavam a construção da identidade exclusivamente na infância e na adolescência. Hoje possuímos uma noção de identidade dinâmica, remetendo para aquilo que assegura a continuidade do indivíduo ao longo de toda a sua vida. A identidade assenta num percurso existencial de permanente mudança, de rutura e crise, de adaptação e reinvenção das nossas diversas identidades. Possuir uma identidade satisfaz a necessidade de sentido de coerência, de estabilidade, de permanência na história de vida de cada um. Só assim o indivíduo consegue adaptar-se às contínuas mudanças que sucedem na sua existência. Sem esse sentido de coerência, surgiriam perturbações de personalidade, como a difusão de identidade. Em suma, a identidade é multidimensional, isto é, possui várias dimensões que são reguladas pelo Eu. O ser humano auto-organiza-se dando coerência às diversas mudanças que ocorrem sucessivamente na sua vida e no meio ambiente.

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